Tinha uma loja no meio do caminho
Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. Nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no meio do caminho no meio do caminho tinha uma pedra. (Carlos Drummond de Andrade)
Por Manoel Fernandes Neto
49 anos, é jornalista e diretor de www.cmm.art.br
Transformar boas iniciativas em algo descartável, ou padronizar para reinar, ou, ainda, manter-se intacta da cultura de massas superficial e enervante parece ser outro dos tantos dons da Internet. Lojas virtuais não fogem à regra. “É comércio”, dirão os incautos. “É acima de tudo arte, uma experiência”, insistirão os poetas.
Preço bom e produtos bons é regra básica e antiga. Mas é só isso? Nada mais pode ser explorado na relação com o cliente, que não seja o robótico “atendimento on-line a seu dispor”?
Um design único e bem trabalhado, em um ambiente que agrada, só demonstra o cuidado que a marca tem com todos os detalhes. É de dar enjoo a padronização de lojas virtuais, com o mesmo jeitão de sempre. Um jeito submarino de ser. Com todo o respeito ao megaportal de departamentos.
Mas são casos diferentes. Falamos aqui de lojas pessoais, autorais, produtos que fogem da linha de commodities de produção em massa.
Falamos aqui dos antigos bazares, que a visita diária era tão gostosa como a compra. “Dona Cris, chegou uma novidade bem bacana para a senhora. Sente-se, tome um chá, leia algo, eu vou buscar”.
“Quem tem pressa, come cru” (já ouvi isso em algum lugar). Vivemos em um mundo com uma falsa pressa. Não sabemos por quê. Só que estamos sempre com pressa.
E-mails, links, páginas, cores. A última notícia que não era da minha conta, o post na rede daquele “amigo” que nem sei de quem se trata.
A pouca conversa com filhos, maridos, mães, sogros, sogras e pais, cônjuges. “Me passe um SMS”.
Engolimos, não saboreamos.
A loja atual deve transcender, para tocar o coração. “Ei!, Ei!, somos humanos por detrás deste preço”.
Sinta o design, aprecie as formas sob as funcionalidades. Encante-se com o conteúdo. Fale devagar, curta estes momentos nas suas lojas preferidas.
A propósito, o movimento internacional Slow Food (http://www.slowfoodbrasil.com/) há mais de 20 anos luta contra este falso frenesi da era tecnológica, que elimina tradições e o amor no ato de se alimentar. No mesmo sentido, a CMM vem com ações pregando que você experimente, no seu dia a dia, atos extraordinários como “mexa na terra ou ocupe os céu e conte nas redes”, visando inspirar outras pessoas.
Comprar é, sim, muito válido, mas curtir com consciência o lugar onde você realiza suas compras digitais tem o mesmo valor do que o bem adquirido. Principalmente, porque um relacionamento saudável nunca é esquecido no “fundo do armário”.